quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Outono

É outono.
As folhas caem.
Parecem cair todas a minha frente. 
Sobre mim.
Estou perdida. 
Não vejo a fila que vinha seguindo aos trancos e solavancos.
E agora?
Ouço uma voz que diz: "Vamos dar a volta pela folha."
Não será fácil.
Mas logo verei a fila novamente.


quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Meditando

Todo dia eu pego o Davi na escola por volta de 11 horas para o almoço. À tarde, ele volta para a escola.
Hoje, quando cheguei, ele me perguntou:
- Por que você chegou tão cedo mamãe? Eu estava meditando.
- Meditando Davi? E quem foi que te ensinou isso? - perguntei, achando que ele ia dizer que foi a professora, ou a coordenadora.
- Foi você mamãe, não se lembra?
Resultado de imagem para criança meditandoEu realmente não lembrava. Mas recordei que um dia em que ele estava muito agitado, eu o chamei e sentamos na cama e fechamos os olhos e respiramos.
- E como foi, Davi? Foi na sala?
- Foi fora da sala. Eu peguei umas almofadas, e dobrei as as pernas daquele jeito que você ensinou, fechei os olhos e contei até cinquenta. E quando chegou no cinquenta eu estava em outro lugar. Parecia um jogo, um tabuleiro. E eu vi umas coisas luminosas que eram as fases. Um monstro ia me atacar por trás, mas aí você chegou e eu não consegui ver como era o monstro.  Quando a gente chegar em casa, eu vou continuar, para ver que monstro era esse.

E assim fez, contou até 10 e continuo sua viagem.

A gente diz coisas e faz coisas que a gente mesmo esquece, mas semanas ou até meses depois nossos filhos nos lembram que tudo que dizemos e fazemos e ensinamos e prometemos será lembrado. E não é maravilhoso se forem coisas boas como essa?

terça-feira, 2 de junho de 2015

Agente duplo


Dia desses, no carro, no caminho de volta do colégio para casa, Davi me conta por que está triste. O João (os nomes dos coleguinhas são fictícios) deu uma pulseira para o Miguel e disse para ele não ser mais amigo do Davi.
- E o Miguel aceitou, Davi?
Aceitou, e Davi ficou triste. E disse que o colega o traiu, que ele era como aquele cara do filme do Indiana Jones, que parecia que era amigo do Indiana mas trabalhava para os bandidos ("Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal", que assistimos uns dias antes, o personagem do qual o Davi fala é um antigo parceiro de Jones que se vende para o outro lado em troca de tesouros, ao mesmo tempo que finge estar do lado do "amigo" Indiana).
Na hora, demorei um pouco a lembrar do personagem e a entender o raciocínio do Davi. Até hoje não entendi bem se falava do João, ou do Miguel. Mas sei que a atitude dos dois o magoou.

Como pais, precisamos ensinar nosso filhos a lidar, da melhor maneira possível, com as situações frustrantes que acontecem em suas vidas, e não podemos, de forma alguma, ficar com raiva de outra criança que magoou nosso amado e querido filho. Assim, respirei fundo e conversei com meu filho.
- Davi, o Miguel pode estar confuso com essa oferta. Eu acho que ele não fez uma boa escolha porque um amigo não se troca, um amigo vale muito. Quem sabe ele apenas não precisa de um tempo para pensar. E nesse tempo, você pode dar atenção aos seus outros amigos, como o Manoel, o Joaquim...
E Davi, diz:
- Mas mamãe, eu gosto do Miguel.
- Eu sei meu amor. Tenha paciência, dê um tempo para o Miguel pensar e brinque com seus outros amigos por uns dias. Assim, se ele for mesmo seu amigo, sentirá falta de brincar com você.

O tempo passou e ontem eu perguntei a ele se aquele problema com o Miguel tinha se resolvido, se eles voltaram as boas, e Davi fez um ok com o dedão e não quis mais falar no assunto.
Nesses últimos dias, ele está dando mais atenção a uma coleguinha que vez por outra dá um mimo para ele.


sexta-feira, 29 de maio de 2015

Calminha

Perto da empresa onde trabalho mora uma vovó, uma idosa.
Edgar Degas
A velha mulher italiana
1857
The Metropolitan Museum of Art, NY
Reprodução óleo sobre tela
Quando está bem, fica sentada no batente, calada, absorta, perdida em suas lembranças, em seus pensamentos, olhando a vida passar.
Quando não está bem, fica andando, indo e vindo na mesma calçada, gesticulando, xingando Deus sabe quem, em alto e bom som,  para quem quiser ouvir, e se responder, aí a confusão está feita.
Hoje eu vinha saindo pelo portão do estacionamento, e ela se levantou do batente, na mão o pano sobre o qual se senta. Veio andando na direção de sua casinha, que fica do outro lado da rua.
Pensei: como estará a vovó hoje?
Ela vinha em minha direção e quando chegou bem perto,  disse:
- Você é bonita, viu? Muito bonita.
Ufa, a vovó hoje está calminha, calminha.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Oração de São Francisco de Assis comentada

"Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz."
"Onde houver ódio, que eu leve o amor;" - que pelo menos eu não dissemine, nem alimente mais ódio
"Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;" - que se eu ofender alguém, eu pelo menos me arrependa, e que se alguém me ofender, eu perdoe, mesmo que leve algum tempo
"Onde houver discórdia, que eu leve a união;" - que eu não jogue brasa quente no fogo já quase extinto
"Onde houver dúvida, que eu leve a fé;" - ah, se a minha fé fosse do tamanho de um grão de areia!
"Onde houver erro, que eu leve a verdade;" - que eu seja coerente com  minhas verdades, mas não queira impô-las a ninguém
"Onde houver desespero, que eu leve a esperança;" - que minha esperança esteja em Deus, e que eu consiga levar um pouquinho que seja de paz a quem está desesperado
"Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;" - que eu não negue um sorriso, um abraço, uma piada
"Onde houver trevas, que eu leve a luz." - aí complica Senhor, se eu puder ser um fachozinho de luz na vida daqueles que amo, já é suficiente para mim, mas Tu és maior e sabes muito mais

"Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;

amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe,
é perdoando que se é perdoado,
e é morrendo que se vive para a vida eterna."


Que eu não deixe de buscar ser o que São Francisco de Assis pediu para ser, mesmo que eu não acredite ser capaz de tanto.
Amém
Hábito de São Francisco de Assis, todo remendado, preservado na Basílica de Assis


domingo, 5 de abril de 2015

Tiriri, caixinha de fósforo

Nesses dias de mudanças de chefia lembrei do meu primeiro chefe. Luis Carlos Soares Timbó. Meu chefe de sempre na Secrel. Um profissional competente e muito dedicado, que foi extremamente paciente comigo. Paciente com a estagiária dedicada mas arrogante, com a profissional que depois de diagnosticada como diabética não quis mais viajar a trabalho aos confins do Brasil, porque morria de medo de não ter hora certa para comer, não encontrar os alimentos da dieta, ou de passar mal longe de casa.
Timbó, cabelo cinza, véi, Crispim, uma figura ímpar, com suas brincadeiras, ditos e piadas que nos faziam rir demais. Foram 11 anos de uma convivência profissional e pessoal muito rica. Aprendi muito com ele. Tenho muito a agradecer. A próxima vez que visitar a Secrel vou fazer isso, dar um forte abraço e mostrar esse post a ele.
"... e tiriri caixinha de fósforo.
Quero nem saber se peba põe, eu quero ver é a ninhada.
Cês não vão não ovão, cê bebe cachaça ovinho.
Enquanto descansa carrega pedra.
Pra comer é um leão, pra trabalhar é os empurrão.
Que Deus te abençoe e a mim não desampare.
Eu só queria falar com Francisco José."

Turma do Crispim






domingo, 15 de março de 2015

Ser e Ter

            Ultimamente ouvi tantas histórias de suicídio e uso de drogas entre adolescentes, e mesmo com Davi ainda pequeno, me atemorizo e procuro os porquês para tentar fugir deles. As histórias que ouvi são sobre adolescentes de classe alta, que estudam em colégios caros. Aí vem as conjecturas: pais ausentes, filhos mimados, que tem tudo que precisam e ainda muito mais, e que quando se frustam - a(o) menina(o) não quer mais namorar comigo, estou entediado, o que será de mim sem esse ou aquele, sem isso ou aquilo? - buscam uma saída radical.
            Quem nunca, na adolescência, com raiva de uma bronca ou proibição dos pais, não pensou: se eu morresse ela(e) ia se sentir culpado? Daí para a ação eram léguas de distância. Na verdade, esse pensamento não passava disso, uma pensamento, que passada a raiva, logo cedia à razão e à vontade de viver e experimentar, aproveitar, que era afinal era o motivo de tantas brigas entre pais e filhos.
Resultado de imagem para o principe sem sonhos
             Será que é esse o segredo? Não ter tudo e poder querer, poder sonhar, e saber, por experiência própria,  que não ter não tira pedaço, não é o fim do mundo, e muito menos o fim da vida.

              Li com Davi um livro muito legal que fala sobre isso, chama-se "O príncipe sem sonhos". Em resumo, um menino que tinha tudo que queria, pois seus pais amorosos davam a ele mal ele fazia menção de querer. E ele estava triste porque achava que não tinha sonhos, e que talvez sonhos nem existissem, mas numa conversa com o avô ficou sabendo que sim, os sonhos existem mesmo quando não podemos vê-los, e que existe diferença entre ter e ser.




quarta-feira, 4 de março de 2015

Uns mil

Este mês, Davi vai fazer suas primeiras provas (assim chamávamos em meus tempos de estudante). 

Para ajudá-lo, usando uma avaliação do ano passado, elaborei questões e imprimi. 

- Davi, estou preparando uma tarefa para você resolver e estudar para as avaliações.
- Então vou fazer tarefas para você também mamãe. 
E vai escrevendo e falando. Logo eu ouço "tia, nome, data, nota".
- E você vai me dar uma nota, Davi?
- Sim mamãe, a nota é muito importante.
- E como é que é Davi? Se eu acertar todas as questões, qual vai ser minha nota? - disse, esperando a resposta para explicar quais notas eram boas, que não era preciso tirar dez para ser bom aluno. 

E Davi, como não raro acontece, me desarma totalmente com sua resposta.
- Deve ser uns mil. 


sábado, 28 de fevereiro de 2015

Não fui eu que escrevi, mas...

"You like every one; that is to say, you are indifferent to every one."
Oscar Wilde, The Picture of Dorian Gray

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Não fui eu que escrevi, mas ...

"A possibilidade não era uma bolsa ou caixa que poderia ser fechada e selada, era uma queda d'água aberta que recebia qualquer coisa, qualquer coisa; ninguém podia escolher ou direcionar ou destruir a poderosa corrente de possibilidades."
Jante Frame dm Rumo a outro verão. Editora Planeta do Brasil, 2009.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Mamãe Amarela

Na cama com Davi, naquela horinha em que o sono já vem chegando e a criança se agarra aos últimos momentos de consciência.
- Mamãe, diz uma coisa legal.
- Coisas que eu acho legais?
- É.
- Sol, praia, e caminhar na praia sob o sol. Ler. Comer. Passear. Agora é sua vez?
- Brincar, brincar, e brincar. Jogar, jogar, jogar. Ver filme. E ...
- Já sei, e receber beijos e abraços da mamãe.
- É, e você gosta de dar cheiro no meu suvaco.
- É sim, eu adoro.
- E eu, gosto que você cheire, e de beijar e abraçar a mamãe amarela.
- Está me chamando de amarela é?
- Não mamãe. Amar ela, amar a mamãe.
- Ah, ah, ah, ah, eu entendi amarela Davi e não amar ela.
- Ah, ah, a mamãe amarela.

Arquivo: Vincent van Gogh - Quarto de Van Gogh em Arles - Google Art Project.jpg
Quarto em Arles, Vincent Van Gogh (Fonte:Análise...)